quinta-feira, 5 de maio de 2011

Infância

Costumo dizer com frequência que não me lembro de muita coisa do período da infância, principalmente do meu relacionamento com as pessoas, e até isso faz com que queira escrever um pouco dessa altura, pode ser que com a tentativa de passar a escrito alguns dos acontecimentos, me leve a relembrar algo...

Do período até aos 6 anos não me lembro da casa onde vivi com os meus pais, sei onde fica porque me disseram, mas do espaço físico, do seu interior, nada...depois mudámo-nos para outra casa e, as memórias que ainda perduram são dessa casa onde ainda hoje os meus pais vivem e que vou lá regularmente.

Confesso que falar nunca foi o meu forte, mesmo entre os mais próximos, desde que me conheço que sempre fui muito introvertido e até envergonhado.

Só consegui libertar-me desse problema lá para os 16, 17 anos.....

Cresci até aos 10 anos sem irmãos, numa família comum e não me lembro de quase nada dessa altura, apenas que era muito tímido, sossegado e pacato.
Era o melhor aluno da escola primária, A Voz do Operário, filial da escola principal, que existia perto da Estrela em Lisboa, ... era o que servia de exemplo aos outros.
Do tempo das reguadas originadas pelos erros dos ditados diários, via os outros a estenderem as mãos alternadamente porque era difícil suportar tantas numa só.
Era sempre o escolhido para demonstrar a caligrafia no quadro de ardósia, e eu lá ia, não sei se com vaidade ou não, mas sinto que não...
Lembro-me dos sorteios que se faziam na primária, já não sei porque razão, que quase sempre acertava nos números antes deles saírem...

Lembro-me das tardes passadas sózinho a brincar com os meus carrinhos no chão da sala, dos jogos com dados que supostamente eram para serem jogados por várias pessoas, mas não fazia mal , era eu e mais uns tantos imaginários a jogarem. Lembro-me do Jogo da Glória, que pertencia ao meu pai e que sempre que ía a casa da avó paterna, pedia para jogar, sózinho...

O meu relacionamento com as artes em geral, revelou-se desde cedo, pois na primária existia uma parceria com alguma entidade ligada ao meio artístico, vejo agora que era um conceito muito inovador para a época, princípios dos anos 60, para termos contacto com várias técnicas com trabalhos manuais, colas, papéis de lustro, tintas, marcadores, plasticinas e barros. Depois de apreciados por uma professora independente, eram seleccionados os que deveriam continuar, o que habitualmente se diz que "têm jeito para a coisa", e então no dia que a actividade se desenrolava numa sala ao lado, era uma alegria. 

São durante esses primeiros anos que a minha avó tem uma importância especial para mim (nós e os avós......), era ela que me fazia a comida preferida, era ela que me dava atenção típica das avós, era para ela que fazia mini esculturas de animais em plasticina, que até hoje não consigo arranjar explicação para o facto de sairem com tanta perfeição, que ela expunha na cozinha. Foi com ela que passei algum tempo quando a minha mãe foi internada no Hospital de Santa Maria, e foi a primeira avó a partir num domingo. Os domingos começaram cedo a fazer parte das "coincidências" desta vida...
Aconteceu de repente...., teve sempre uma saúde débil, foi a primeira vez que vi o meu pai chorar na cozinha de casa dela, depois de ter recebido a notícia, e após uma viagem curta de carro muito mais rápida do que o habitual.
Daquela Avó resta a memória duma vida de dedicação exclusiva aos outros, de uma vida sem viagens ou divertimentos, de uma vida ao lado do marido que trabalhava de manhã à noite, feriados e domingos.

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